Desde a tarde de ontem (9) os deputados da bancada ruralista da Câmara dos Deputados vêm tentando forçar uma votação surpresa da PEC 215 na Comissão Especial da casa, desrespeitando normas e regimentos das comissões e impedindo a entrada de manifestantes contrários ao projeto. A PEC 215 transfere do Executivo para o Legislativo o poder de homologar Terras Indígenas (TI), Unidades de Conservação (UC) e territórios quilombolas.
A votação estava prevista inicialmente para a manhã de ontem, mas foi cancelada no início da tarde. Por volta das 14h, no entanto, a Comissão foi convocada às pressas e a votação foi remarcada para acontecer às 16h, pegando tanto a imprensa, como os movimentos sociais e os deputados de oposição de surpresa.
Grupos de indígenas que estavam no Congresso participando de outra atividade deslocaram-se rapidamente para o local da reunião, assim que ela foi anunciada, e começaram a se manifestar contra a aprovação da PEC 215.
A sessão chegou a ser iniciada, com um quórum que seria suficiente para a votação – e majoritariamente composto por deputados ruralistas. Mas depois que parlamentares contrários ao projeto, como Ivan Valente (PSOL/SP) e Afonso Penna (PV/SP), chamaram atenção para a irregularidade da reunião, que começou enquanto a sessão ainda estava aberta no plenário, o presidente da Comissão, Afonso Florence (PT-BA), desconheceu a abertura da reunião e o quórum presente, adiando a votação para a próxima terça-feira, dia 16, às 14h.
Mas nesta quarta-feira o grupo ruralista da Câmara preparou um novo golpe, agendando, novamente às pressas, uma reunião extraordinária para o fim da sessão plenária, que acontece por volta das 18h.
Desta vez, no entanto, os movimentos sociais foram impedidos de entrar. Os corredores foram bloqueados pela polícia do Congresso e houve até troca de golpes entre deputados. Além disso, o presidente da Comissão estrategicamente não compareceu. Sendo assim, a reunião foi presidida pelo vice-presidente, o deputado Nilson Leitão (PSDB/MT), um notório ruralista.
“É impressionante que o povo seja proibido de adentrar à ‘Casa do povo’ e mais impressionante ainda é que os povos indígenas sejam proibidos de participar de uma reunião que irá decidir o futuro da demarcação de suas terras”, afirma Rômulo Batista, da campanha da Amazônia do Greenpeace.
Golpe brutal contra indígenas e contra o meio ambiente
O parecer da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/2000, apresentado pelo deputado ruralista Osmar Serraglio (PMDB-PR) como um substitutivo, propõe uma ampla gama de exceções ao direito de posse e usufruto das terras por parte dos povos indígenas, além de inviabilizar novas demarcações e legalizar a invasão, a posse e a exploração de Terras Indígenas demarcadas. O projeto transfere, ainda, do Executivo para o Legislativo a prerrogativa de aprovar a oficialização de TIs, UCs e territórios quilombolas e adota a data de promulgação da Constituição (5/10/1988) como “marco temporal” para comprovar a posse indígena. Ou seja: a comunidade teria direito à terra apenas se puder demonstrar que ocupava o território nessa data.
“No dia em que a presidenta Dilma chorou ao receber o relatório da Comissão da Verdade, que investigou os crimes da Ditadura Militar e solicita um aprofundamento na questão indígena e camponesa, a bancada ruralista usa de todas as artimanhas políticas para perpetuar o mesmo tipo de massacre visto nos anos de chumbo”, lamenta Rômulo Batista.
O Greenpeace espera que, caso aprovada a PEC 215, a presidenta cumpra com sua palavra, empenhada em carta aberta aos povos indígenas, e vete a proposta. Para que, num futuro próximo, não tenha que chorar também pela vida dos povos que têm agora seus direitos subjugados e pela derrota na luta mundial contra as mudanças climáticas.
Se aprovado na comissão, a PEC segue para votação do plenário da Câmara dos Deputados.