O Partido Solidariedade protocolou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 1.282, pedindo que a Corte fixe regras claras e uniformes para o afastamento de governadores pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A ação surge em meio à polêmica envolvendo o afastamento do governador do Tocantins, Wanderlei Barbosa (Republicanos), ocorrido em 3 de setembro de 2025, e recoloca em pauta o delicado equilíbrio entre a independência do Judiciário e o princípio da soberania popular — um tema que vem provocando divergências desde a Constituição de 1988.
No documento protocolado, o Solidariedade afirma que o Poder Judiciário tem extrapolado os limites de atuação ao suspender o exercício de mandatos obtidos nas urnas com base no artigo 319, inciso VI, do Código de Processo Penal (CPP).
O dispositivo prevê que o juiz pode determinar a “suspensão do exercício de função pública” quando houver receio de que o cargo seja utilizado para a prática de crimes.
Segundo a legenda, o problema está na interpretação elástica desse artigo. Em várias ocasiões, juízes e tribunais teriam afastado autoridades eleitas sem denúncia formal e com base em fatos não contemporâneos ao mandato vigente.
“Não se pode admitir que governadores sejam coercitivamente retirados do exercício da função em razão de investigações de fatos que não guardam contemporaneidade com o mandato popular em curso”, afirma o partido em sua petição.
O caso Wanderlei Barbosa como exemplo
O caso que motivou a ação foi o do governador Wanderlei Barbosa, afastado pelo STJ por 180 dias no âmbito da Operação Fames-19, que investiga supostos desvios de recursos públicos durante a pandemia.
Para o Solidariedade, a medida foi excessiva e desproporcional, especialmente porque os fatos investigados ocorreram antes do atual mandato.
Na avaliação da sigla, o afastamento de Barbosa é um símbolo da insegurança jurídica que paira sobre os limites do Judiciário em relação a gestores eleitos. “O STJ tem aplicado o mesmo artigo de forma desigual, adotando interpretações distintas em casos semelhantes”, diz o texto da ação.
Pedido liminar e mérito da ADPF 1.282
O Solidariedade pede ao STF medida liminar para reintegrar imediatamente Wanderlei Barbosa ao cargo de governador do Tocantins, até o julgamento definitivo da ação.
No mérito, solicita que a Suprema Corte estabeleça parâmetros objetivos para o uso do artigo 319, inciso VI, do CPP. Entre as regras propostas, estão:
- O afastamento de governadores somente após o recebimento da denúncia;
- A denúncia deve estar baseada em fatos contemporâneos ao mandato;
- A decisão precisa ser colegiada pelo STJ, não monocrática;
- O afastamento deve ter prazo máximo e improrrogável de 180 dias.
Se acolhida, a decisão poderá mudar o entendimento judicial em todo o país, criando um marco regulatório para o afastamento de chefes de Executivo estaduais.
Relatoria e expectativas
A ADPF foi distribuída ao ministro Gilmar Mendes, do STF, o mesmo relator da ADPF 1017, que tratou de tema semelhante no estado de Alagoas.
Fontes jurídicas apontam que a escolha do relator não é coincidência: o Solidariedade quer aproveitar o precedente alagoano, em que Gilmar Mendes reconheceu a necessidade de contenção judicial e respeito à vontade popular.
Especialistas avaliam que a Corte pode utilizar o caso como oportunidade para uniformizar a jurisprudência sobre o afastamento de governadores e delimitar o poder cautelar do STJ.
Impacto político e jurídico
A iniciativa do Solidariedade tem implicações que vão além do Tocantins.
Caso o STF acolha os pedidos, mudará profundamente a dinâmica de controle judicial sobre mandatários eleitos, estabelecendo limites claros à atuação de ministros e desembargadores em decisões monocráticas.
Para juristas, trata-se de um debate de alta relevância constitucional, pois toca no coração do sistema democrático: o direito de o povo ver seu voto respeitado até que haja decisão definitiva.
Enquanto o país acompanha os desdobramentos, o governador afastado Wanderlei Barbosa mantém silêncio público, mas aliados veem na ADPF 1.282 uma esperança concreta de retorno ao cargo.
Por: Geovane Oliveira



